sábado, 7 de agosto de 2021

[0296] A opinião de Galopim de Carvalho sobre os professores e os educadores

Recentemente, o geólogo António Galopim de Carvalho pronunciou-se assim sobre os nossos professores e educadores:


Devo começar por afirmar que não estou aqui para agradar ou desagradar a quem quer que seja. Estou apenas a revelar a análise que faço de um problema nacional que sempre me preocupou. Em tempo de férias e a meio de uma pandemia e de uma pré-campanha eleitoral sem qualidade no conteúdo e na forma, desejo saudar os professores (sem esquecer os educadores) das nossas escolas e reafirmar que os considero entre os mais importantes pilares da sociedade e, uma vez mais, dizer a governantes e governados que é necessário e urgente restituir-lhes a atenção, o respeito e a dignidade que a liberdade e a democracia lhes retiraram.
É verdade que dispomos de um parque escolar como nunca houve, é verdade que temos escolas em número suficiente para acolher a totalidade da população em idade escolar, é verdade que foi institucionalizado o ensino obrigatório e gratuito até ao 12.º ano e é verdade que se democratizou o ensino, mas só na letra da lei. Basta comparar as posições relativas das escolas públicas e privadas nos agora intitulados «rankings» (uma maneira desnecessária de dizer classificações).
Ao longo destes anos, verifiquei que:

·       A preparação científica e pedagógica dos professores não tem sido devidamente testada, através de processos de avaliação a sério, criteriosamente regulados, por avaliadores devidamente credenciados;

·       Como no antigamente, a par de bons, muito bons e excelentes professores, muitos deles desmotivados, há outros, francamente maus, instalados na confortável situação de emprego garantido até à reforma;

·       Os sindicatos, nivelando, por igual e por baixo, os bons e os maus professores, têm grande responsabilidade numa parte importante da degradação do nosso ensino público;

·       Os livros e outros manuais de ensino repetem-se acriticamente, com discursos estereotipados, em obediência a programas mal pensados, levando ou, melhor, obrigando os professores, não a ensinar e formar homens e mulheres conscientes do mundo e da sociedade onde vivem, mas a «amestrar» alunos a acertar nos questionários de exames, por vezes, autênticas charadas;

·       As sucessivas tutelas parecem estar mais interessadas nas estatísticas do que na qualidade do ensino;

·       Os programas oficiais amarram os professores, não lhes dando tempo para, como alguém disse, «divagações desnecessárias»;

·       Os professores estão sobrecarregados com tarefas administrativas e outras de que deveriam estar rigorosamente libertos;

·       Os professores estão mal pagos e muitos deles vivem longe das famílias ou perdem horas nos caminhos diários de ida e volta a casa e a contarem os tostões.

Em finais de 2015, na cerimónia de entrega do Prémio Manuel António da Mota, no Palácio da Bolsa, no Porto, o primeiro-ministro, disse: «De uma vez por todas, o país tem de compreender que o maior défice que temos não é o das finanças. O maior défice que temos é o défice que acumulámos de ignorância, de desconhecimento, de ausência de educação, de ausência de formação e de ausência de preparação.» Palavras sábias, mas que não passaram disso. A verdade é que continuamos na mesma, cada vez com mais futebol e, agora, entretidos a tempo inteiro, dos pais aos filhos crianças, a dedilharem nos telemóveis.
Quem não vir esta realidade ou é «cego» ou «tapa os olhos».
É, pois, urgente olhar para esta realidade e haver vontade política (despida de constrangimentos partidários) para promover uma profunda avaliação e consequente reformulação de uma «máquina ministerial» poderosa e nebulosa, de há muito, instalada.

 

Fonte: opinião de António Galopim de Carvalho no jornal «Público» (2021)

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