A exposição “Um homem
chamado Romeu Correia” foi inaugurada no
Museu da Cidade de Almada no passado dia 8 de Abril, estando aí em exibição até
ao próximo dia 31 de Dezembro.
Biobibliografia de Romeu Correia apresentada no sítio do
Instituto Camões:
(Cacilhas, 17-11-1917 – Almada,
12-06-1996)
Romeu Henrique Correia foi um
“[e]scritor de raiz autenticamente popular, arrancando os seus temas
(dramáticos e narrativos) à sua experiência dos meios proletários e
pequeno-burgueses da capital e da sua cintura” (Rebello 1984: 63).
Paralelamente, houve o contacto
com grupos de teatro amador de Almada, propício para incentivar e consolidar
“uma carreira de autor dramático que o levaria até à primeira fila do nosso
teatro contemporâneo e em que se combinam habilmente elementos do teatro de
fantoches e de feira, do circo, do melodrama populista e do teatro de
vanguarda” (Idem, ibidem).
Romeu Correia,
sem data
[Arquivo da
Companhia de Teatro de Almada]
A crítica expressou-se de
imediato em termos lisonjeiros, designando o autor como “o mais genuíno dos
dramaturgos de tendência neo-realista” (Rebello apud Flores 1987: 35) e
“a maior revelação teatral do neorealismo” (António José Saraiva, apud Flores,
Ibidem: 19). Essa posição ficou alterada pela mudança de rumo do
dramaturgo, que inicialmente se adaptou ao neorealismo com a preocupação social
e pedagógica, para a seguir oscilar “entre o irreal e o vital, o imaginativo e
a realidade comezinha, excepto na ‘crónica dramática e grotesca’ Bocage,
que, sendo um dos belos exemplos de teatro épico em Portugal, se institui,
sobretudo, como uma narrativa de visualização plástica” (Mendonça 1971: 25-26),
ou então conjugando o realismo popular com elementos imaginários, recusando-se
“à fixação num modelo rígido que aliás o neo-realismo não impõe” (Carlos Porto,
apud Flores, Ibidem), como também expressando “os conflitos
sociais integrando-os no qua há de ritual poético no melhor teatro” (Mário
Sacramento, apud Flores, Ibidem: 18).
As peças de Romeu Correia
revelaram-se, portanto, numa síntese formulada a posteriori, a meio
caminho entre realismo e expressionismo, de que são protagonistas os humilhados
que afirmam os seus sonhos de resgate, a sua luta quotidiana, as problemáticas
ligadas ao seu estatuto social. Pela fusão poética destes elementos, O
vagabundo das mãos de oiro recebeu o Prémio da Crítica e foi unanimemente
considerada a obra-prima do dramaturgo.
Para traçar cronologicamente o
percurso de Romeu Correia, é preciso recuar aos finais dos anos 30, quando
começou a escrever farsas carnavalescas em 1938, sendo Razão a sua peça
de estreia, representada pela primeira vez em 1940 por um grupo amador de
Almada. Espetador teatral assíduo, foi sobretudo no Teatro Estúdio do Salitre
que absorveu as várias tendências estéticas modernas e contemporâneas que são
visíveis nas suas peças num acto: Laurinda (1949, editada no mesmo ano
nas páginas da revista Vértice), As cinco vogais (1951) e Desporto
rei (1955).
A imediata representação de uma
das suas peças pelo Grupo de Amadores da Sociedade Guilherme Cossoul deu-lhe o
estímulo para escrever Casaco de fogo (1953, publicada pela primeira vez
em 1956), peça dum simbolismo expressivo que descreve a vida nos bairros
pobres, e que foi levada à cena em 1953 pelo Teatro Nacional D. Maria II.
Seguiram-se os três atos de Céu da minha rua, apresentados em 1955 no
Teatro Maria Vitória com o título Isaura, a galinheira (que terá
posteriormente uma versão televisiva), Sol na floresta (publicada em
1968 no volume Três peças de Romeu Correia juntamente com Laurinda
e Céu da minha rua) e O vagabundo das mãos de oiro (1960), sendo
estas últimas levadas à cena respetivamente em 1957 e em 1962 pelo Teatro
Experimental do Porto (companhia que, em 1968, propôs uma nova montagem de Desporto
rei).
O vagabundo das mãos de oiro, farsa poético-política em três actos, cujo espetáculo
de estreia absoluta mereceu o Prémio da Crítica de Teatro, teve êxito também
junto dos leitores, tendo sido objeto de várias reedições, bem como de
traduções para alemão (foi incluída na antologia organizada por José Luís de
Freitas Branco, Dialog Stücke aus Portugal: Santareno, Coutinho, Rebello,
Correia, Berlim, 1978) e italiano (na antologia abaixo referida, Teatro
portoghese de XX secolo, Roma, 2001).
Se o texto seguinte, Jangada
(1962, farsa em dois atos apresentada em 1966 no Teatro Villaret pela Companhia
Portuguesa de Comediantes), se concentrava nos preconceitos e conflitos
geracionais, em Bocage (1965) detetavam-se elementos das teorias
brechtianas, inseridos através da parábola do poeta maldito que deu o título à
peça, tornando-se emblema da decadência de uma época. A produção completa de
Romeu Correia conta ainda com Amor de perdição (1966) “glosa dramática”
redigida por encomenda a partir do romance homónimo de Camilo Castelo Branco; O
cravo espanhol (1969, representada em 1970 no Teatro Capitólio), com tema
etnográfico; Roberta (1971, levada à cena pelo Teatro Estúdio do
Barreiro em 1972, distinguida no mesmo ano com o Prémio da Casa da Imprensa e
produzida em versão televisiva transmitida pela RTP em 1977), inspirada nas
antigas feiras e nos tradicionais robertos, marionetas que aqui encarnam
tipos humanos; A vaga (1977); Grito no Outono (1980); As
quatro estações (1980, encomendada pela Secretaria de Estado da Cultura e
redigida para a televisão), empenhada na defesa dos direitos dos grupos
socialmente excluídos e marginais; Tempos difíceis (1982, levada à cena
no mesmo ano pelo Grupo de Teatro de Campolide), inicialmente intitulada Rectaguarda,
baseada nos acontecimentos que, em 1958, envolviam a candidatura às eleições
presidenciais do general Humberto Delgado, e as esperanças de renovação por
parte dos progressistas que o apoiavam; O andarilho das sete partidas (1983),
sátira comemorativa do IV centenário da morte do navegador Fernão Mendes Pinto
pelas evocações as suas façanhas; A palmatória (1995), farsa trágica
sobre a figura do poeta satírico setecentista Nicolau Tolentino.
Para além da edição de alguns
volumes de narrativa e de contribuições variadas dispersas na imprensa
periódica, recorde-se a sua adaptação teatral, redigida por encomenda em 1968 e
inédita, do romance A rosa do adro (1870), de Manuel Maria Rodrigues. Em
1984 recebe o "Prémio de Teatro 25 de Abril" atribuído pela
Associação Portuguesa de Críticos de Teatro.
* Este texto é a versão revista e em português da ficha
bio-bibliográfica de Romeu Correia editada in: Sebastiana Fadda (a cura di),
Teatro portoghese del XX secolo, Roma, Bulzoni Editore, 2001. Desta
antologia faz parte a peça Il vagabondo dalle mani d’oro.
Romeu Correia foi ainda
conhecido como desportista e cidadão.
Fontes na internet:
Museu da Cidade de Almada; Instituto Camões