sábado, 22 de setembro de 2018

[0157] As praias da Nossa Banda: o início da transformação da Costa de Caparica


As praias para usufruto massificado resultaram de uma lenta apropriação e transformação dos seus areais. Na margem Sul do Tejo, a Ponta dos Corvos, a Mutela, a Margueira, Cacilhas, o Ginjal e a Banática começaram, desde a década de 1870, a ser usados pelas famílias aristocratas e burguesas de Lisboa para banhos e natação, seguindo-se-lhes a Trafaria e, mais tarde, a Cova do Vapor e a Costa de Caparica (mensagem «0154»).

A Costa de Caparica foi uma das praias visitadas por Adriano de Sousa Lopes (1879-1944), entre 1922 e 1926, tendo dela feito diversos desenhos e pinturas onde as únicas actividades humanas figuradas são as relacionadas com a pesca:

Manhã na praia da Caparica (óleo sobre cartão; acervo do Museu Nacional de Arte Contemporânea, Lisboa):


Céu da Caparica (óleo sobre tela; acervo do Museu Nacional de Arte Contemporânea, Lisboa):


Sensivelmente pela mesma altura também Raúl Brandão (1867-1930), no seu livro Os Pescadores, de 1923, descreveu a Costa de Caparica:

Da horrível Trafaria à Caparica gastam-se dezoito minutos num carrinho pela estrada através do pinheiral plantado há pouco. Os pinheiros são mansos, anainhos e inocentes: - os pinheiros novos são como bichos novos e têm o mesmo encanto … Ao lado esquerdo desdobra-se o grande morro vermelho a esboroar, e ao outro lado o terreno extenso e plano rasgado de valas encharcadas. De repente uma curva, algumas casotas cobertas de colmo - Caparica. Primitivamente isto foi um grupo de barracas que os pescadores aqui ergueram neste esplêndido sítio de pesca, à boca da barra, a dois passos do grande consumidor. Têm um ar ainda mais humilde que os palheiros de Mira ou Costa Nova. Quatro tábuas e um tecto de colmo negro com remendos deitados cada ano: alguns reluzem e conservam ainda as espigas debulhadas do painço. No imenso areal o barco da duna, sempre o mesmo barco, maior ou mais pequeno, próprio para a arrebentação, de proa e popa erguidas para o céu.”
“Uma grande extensão de areal, só areia e mar, barcos como crescentes encalhados e alguns pescadores remendando as redes. Nem um penedo. Areia e céu, mar e céu. Dum lado o formidável paredão vermelho, a pique, desmaiando pouco e pouco, até entrar pelo mar dentro todo roxo, no cabo Espichel. Do outro o mar azul metendo‑se, num jorro enorme, pela ampla barra de Lisboa, deslumbrante e majestosa. De onde isto é esplêndido é acolá do alto do convento dos Capuchos. Assombro de luz e cor. Amplidão. As casotas da Caparica aos pés, o mar ilimitado em frente, ao fundo e à direita a linha recortada da Serra de Sintra com as casinhas de Cascais e Oeiras no primeiro plano esparsas num verde amarelado … E a luz? E o prodígio da luz? … A gente está tão afeita à luz que não repara nela e trata como uma coisa conhecida e velha este azul que nos envolve e penetra e que desaba em torrentes sobre as águas verdes desmaiadas e sobre as terras amarelas e vermelhas até ao cabo Espichel … Mas fecho os olhos - abro os olhos … Imensa vida azul - jorros sobre jorros magnéticos. Todo o azul estremece e vem até mim em constante vibração. Quem sai da obscuridade para a luz é que repara e estaca de assombro diante deste ser, tão vivo que estonteia …

A pintura de Adriano de Sousa Lopes e a escrita de Raúl Brandão podem ter sido os primeiros sinais, registados, de uma nova visão sobre as praias da Costa de Caparica. Depois, ao longo de um século, seguiram-se as transformações de que hoje somos testemunhas.

Fontes (texto e imagens): Sítio do Museu Nacional de Arte Contemporânea (consultado, sobre a exposição «Sousa Lopes 1979-1944. Efeitos de Luz», em 13 de Outubro de 2015); Wikipédia (sobre Raúl Brandão); Brandão, citado por Gomes (2018; pp. 27-28)


segunda-feira, 17 de setembro de 2018

[0156] A «Orca de Aljezur» deu à costa em Almada


O artista plástico Artur Bordalo, mais conhecido por Bordalo II, descreve a ameaça que a poluição exerce sobre os grandes animais representando-os através do lixo.
Para o Festival O Sol da Caparica deste ano Bordalo II criou a Orca de Aljezur, que evoca não só a poluição dos oceanos como a possibilidade de essa poluição aumentar devido a futuras prospeções dos fundos marinhos:


Com quase oito metros de comprimento, esta peça faz parte da série Big Trash Animals e utilizou o lixo retirado de algumas praias do concelho de Almada durante o Inverno. Segundo o autor, “a ideia passa por representar uma imagem da natureza, neste caso os animais, construída com aquilo que os destrói – o lixo, a poluição e a contaminação”; e, por não pretender que as pessoas fiquem “afastadas da realidade”, foca “pontos sensíveis, relevantes, que fazem parte da consciencialização”, como “forma fazer parte da mudança do Mundo para algo melhor.

Fonte: agenda da Câmara Municipal de Almada (2018)
Imagem: retirada da versão digital da agenda da Câmara Municipal de Almada (2018)

domingo, 9 de setembro de 2018

[0155] A 10ª edição da Feira ObservaNatura


Anualmente, na altura em que as aves migradoras se concentram para passar mais a Sul o Inverno, realiza-se no concelho de Setúbal a Feira ObservaNatura.


Dedicado ao turismo da natureza, este evento decorre este ano na Herdade da Mourisca, na Reserva Natural do Estuário do Sado, na cidade de Setúbal, no Parque Natural da Arrábida, na baía do Sado e na Península de Troia.
Habitualmente, cada edição desta Feira disponibiliza atividades como escalada, caminhadas, observação de aves e de golfinhos, stand up paddle, canoagem e vela.
Este ano haverá transportes que ligam os diferentes pontos onde decorrem as atividades, com paragens na Casa da Baía, no Parque Urbano de Albarquel, no cais de catamarãs, no Moinho de Maré da Mourisca e em Troia.
No Moinho de Maré e na Herdade da Mourisca as ações são especialmente focadas na observação de aves.
No Estuário do Sado realizam-se passeios de observação de aves e estabelece-se ligação às ruínas romanas de Troia através embarcações marítimo-turísticas, com saídas do cais palafítico do Moinho de Maré.

Imagens e outras informações: ObservaNatura

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

[0154] As praias da Nossa Banda no fim do século XIX


Desde a década de 1870 as famílias aristocratas e burguesas de Lisboa acostumaram-se a “ir a ares” para a margem Sul do Tejo, havendo referências de que usavam os areais da Ponta dos Corvos (ou Ponta do Mato), da Mutela, da Margueira, de Cacilhas, do Ginjal e da Banática para banhos e natação.
Um pouco mais tarde começou também a ser usada a Trafaria, que foi ganhando importância face aos condicionamentos introduzidos mais a leste (instalação de fábricas, da Base Naval e do Arsenal de Marinha e alargamento do cais de Cacilhas). Em 1901 foi aí inaugurada pela Rainha Dona Amélia uma Colónia Balnear, que a toponímia local recorda assim:



Depois foram descobertas as potencialidades da Cova do Vapor e, a partir de 1925, as da Costa de Caparica, cuja primeira ligação por estrada chegou via Trafaria.

Fontes: Câmara Municipal de Almada (2015)
Fotografias: Eva Maria Blum