Em 2008-09 as turmas do 9º ano da Escola Secundária D. João II, em
Setúbal, realizaram, na disciplina de História, um levantamento sobre como a
população setubalense passava as férias de Verão na Península de Tróia, nas
décadas de 1950, 1960 e 1970:
Capa do livro (recortada) |
A sua principal fonte consistiu nos testemunhos recolhidos,
através de entrevistas, aos seus familiares e vizinhos mais velhos, tendo o
material recolhido sido trabalhado em aulas e fora delas. Por fim, seis
professores transformaram essa recolha num livro, cuja primeira edição saiu em Maio
de 2009.
Nos Verões dos anos 50 não era apenas Tróia a praia
escolhida pelos setubalenses, também o eram as da Figueirinha e de Albarquel. E
também vinham para estas praias as gentes de Palmela e de Azeitão e, ao
fim-de-semana, do Montijo, do Barreiro e do Pinhal Novo.
Alguns dos entrevistados lembram-se de, sendo ainda jovens nessa
altura, passarem em Tróia quase todo o Verão, estando grande parte desse tempo
os seus pais a trabalhar. Outros lembram-se de lá passarem apenas um mês, um ou
semana, ou tão só alguns dos fins-de-semana.
Testemunhos de alguns dos entrevistados:
“A época balnear começava em
Junho e acabava no final de Setembro.”
“Por volta dos anos 60, as
carreiras eram limitadas: dois barcos que iam de manhã para Tróia e duas
carreiras que vinham de tarde para Setúbal. Era muito limitado! É claro que com
o passar dos anos, com o número de pessoas a aumentar, a frequentar a praia,
começou a haver mais carreiras, mas no princípio era assim.”
“Vinha tudo carregado com as panelas
e com os tachos dentro do barco da Tróia.”
“As pessoas, se quisessem,
podiam até fazer casas em madeira, pois na altura não se pagava o terreno. Mas
a maioria arranjava a areia de modo que ficasse direitinha. De seguida punham a
tendinha e uma manta por baixo, outra por cima, estava feito! Ou então dormiam
por cima de um todo ou uma manta, com aquelas velas dos barcos e os mastros
faziam um tipo de tenda por baixo das velas com uma manta.”
“As mulheres que não trabalhavam
tomavam conta dos seus filhos e também dos filhos daquelas que iam trabalhar.”
“Iam para a praia tomar banho,
passar o dia … levavam o almoço já feito em casa. Estendiam uma toalha mesmo na
areia e era aí que comiam. Outras faziam-no nas barracas que havia na praia,
com fogareiros a carvão e onde se vendia bebidas.”
“Pela tarde, as crianças corriam
ao ouvir o pregão: «Cá está o Ervilha! O Ervilha nunca falha». Este pregão era
do homem dos sorvetes.”
“Antigamente a gente corria
aquilo tudo de lés a lés.”
“O nosso passatempo nessa altura
era irmos à pesca, os mais velhos e os mais novos. Naquele tempo [1955] havia
muito peixe, muita amêijoa e berbigão, muitas navalhas e entretínhamo-nos a
apanhar petiscos.”
“Berbigão aberto na brasa,
ameijôas da marinha feitas de cebolada e também havia navalhas abertas na brasa.”
“Jantávamos e depois mais tarde
conversávamos uns com os outros. Fazíamos uma fogueira, preparávamos uma
cafeteira de café e depois havia um senhor que sabia tocar viola. Ele tocava e
nós conversávamos uns com os outros sobre a vida.”
“Na Caldeira existe uma
capelinha com a Nossa Senhora do Mar. Todos os anos, em Agosto, a senhora sai
da capela levada pelos pescadores numa procissão. Essa festa começava numa
sexta e acabava numa segunda com os pescadores todos atrás do barco que levava
a Santa.”
“Nos anos 50 e 60 as fábricas de
conserva de peixe que hoje já não existem apitavam todas e as operárias vinham para
a muralha acenar à santa com lenços brancos, mas hoje já não se vê isso porque
as fábricas fecharam.”
Em 1961 o arquitecto Rafael Botelho, no jornal «O
Setubalense», defendeu que não se deveria valorizar a Península de Tróia
através da construção, mas sim pela sua natureza e pelo usufruto desta. No entanto,
por volta de 1970, o mesmo jornal anuncia as primeiras propostas oficiais e privadas
para a promoção do grande turismo em Tróia.
Fonte: Colectivo
do 9º ano da Escola Secundária D. João II (2019; os testemunhos correspondem às
pp. 24, 28, 32, 36, 37, 42, 43, 43-44, 45, 48 e 97)
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