sábado, 26 de junho de 2021

[0290] A partir de agora o leitor não será automaticamente avisado por email sobre a publicação das novas mensagens …

 

O seguinte aviso informa que vai ser desactivado, a partir de Julho, o serviço que permitia informar os interessados, por email, da publicação de uma nova mensagem»:


É pena.

Em princípio, este blogue manterá a ritmo de uma publicação por semana, o que permite consultá-lo regularmente para conhecer as novidades.

No entanto, se houver leitores interessados em ser avisados da publicação de cada nova mensagem, poderão informar o bloguer dessa vontade (via pontes.outrabanda.edu@gmail.com) e passarão a receber o aviso através de um grupo de emails (com Bc/c).

domingo, 20 de junho de 2021

[0289] Os arquivos escolares

Num artigo sobre os arquivos escolares publicado na revista «Sísifo» (já referido na mensagem «0025» deste blogue), é mencionado um “levantamento efectuado em 1996, sob a coordenação de António Nóvoa”, através do qual se “demonstrou que o estado de conservação da documentação de arquivo nas escolas secundárias portuguesas” se podia considerar “maioritariamente razoável”, pois, entre as instituições analisadas, 72,3 % se situavam nesse nível, seguindo-se-lhe 11,5 % em nível bom e 10,3 % em mau estado, não havendo informação sobre outras 5,7 %.
No entanto, conforme acrescentou a autora deste artigo, Maria João Mogarro, António Nóvoa encarou com preocupação este “«razoável estado de conservação da documentação»”, dado que ele poderá “«ser posto em causa a curto prazo, já que a capacidade de acondicionamento por parte da maioria das escolas é cada vez menor, […] uma vez que a capacidade de armazenamento de nova documentação é nula em cerca de metade das escolas e muito reduzida nas restantes»”, o que facilmente intensificará “«dois fenómenos negativos»” usuais nestas circunstâncias: “«a eliminação desregrada ou a manutenção desorganizada ou pulverizada dos mesmos»”.

Um quarto de século após este levantamento, qual será o estado de conservação dos arquivos das nossas escolas?

Segundo Maria João Mogarro, os «arquivos escolares» são uma fonte privilegiada para o estudo das «culturas escolares».
Constituída por um conjunto de teorias, saberes, ideias e princípios, normas, regras, rituais, rotinas, hábitos e práticas, a cultura escolar, na sua acepção mais lata, remete-nos também para as formas de fazer e de pensar, para os comportamentos, sedimentados ao longo do tempo e que se apresentam como tradições, regularidades e regras, mais subentendidas que expressas, as quais são partilhadas pelos actores educativos no seio das instituições. Os traços característicos da cultura escolar (continuidade, persistência, institucionalização e relativa autonomia) permitem-lhe gerar produtos, que lhe dão a configuração de uma cultura independente. Esta cultura constitui um substrato formado, ao longo do tempo, por camadas mais entrelaçadas que sobrepostas, que importa separar e analisar. O exercício do arquivo tem um espaço importante neste processo historiográfico de investigação sobre a cultura escolar. Constituído fundamentalmente por documentos escritos, o arquivo ocupa um lugar central que decorre da directa relação da escola com o universo da cultura escrita. A escrita tem, ela própria, uma posição de grande centralidade no quotidiano escolar (na gestão administrativa, nas relações pedagógicas, na construção de saberes, nas relações sociais), estando presente em toda a vida da instituição. É esta íntima relação que o arquivo reflecte, na materialidade dos seus documentos e de forma mais consistente e lógica que os outros espólios, compreendendo-se assim o lugar central que ocupa na vida e na história da escola.

Os documentos de arquivo permitem, a quem investiga as culturas escolares, desenvolver uma grande diversidade de investigações:



Mas, sob o ponto de vista dos «actores escolares», a que «documentos» das suas antigas práticas gostarão eles de aceder e que «memórias» e «reflexões» quererão eles construir a partir deles?

 

O artigo de Maria João Mogarro está acessível a partir da página «Documentos» deste blogue, clicando aí em «Documentos sobre Portugal».

 

Fonte: artigo de Mogarro na revista «Sísifo» (2006)

sábado, 12 de junho de 2021

[0288] O DataLABOR, depois do Instituto Nacional de Estatística e do PORDATA

A nova associação CoLABOR apresenta-se assim no seu sítio:

O Laboratório Colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social mobiliza recursos da academia, empresas, administração pública e organizações da economia social e solidária com vista ao aprofundamento do conhecimento de problemas presentes e antecipáveis em torno de três eixos de atividade: a) trabalho e emprego; b) proteção social; c) economia social e solidária.
O trabalho, o emprego e a proteção social foram politicamente concebidos no pós-guerra no quadro de políticas económicas orientadas para o pleno emprego e políticas sociais baseadas na mutualização (com garantia pública) da proteção de riscos associados ao desemprego, à doença e ao envelhecimento.
Hoje, a complementaridade entre trabalho, emprego e proteção social, tal como a conhecemos, parece estar em risco. Num contexto de acrescidas mudanças económicas, tecnológicas, demográficas, e de acentuação da integração económica e financeira internacional, as vulnerabilidades concomitantes dos regimes de emprego e de proteção social, com a decorrente recomposição das desigualdades e o surgimento de novos riscos societais, configuram o problema que motiva e justifica a criação do CoLABOR.
São objetivos do CoLABOR:

Mobilizar e expandir o conhecimento, hoje disperso em organizações de diferente natureza, para conceber respostas de política (pública e organizacional) aos problemas presentes e emergentes nos domínios do trabalho, do emprego e da proteção social;
Capacitar a administração pública, as empresas e as organizações da economia social e solidária, reforçando instrumentos de análise e intervenção, de antecipação de mudanças tecnológicas e socioeconómicas e de apoio à tomada de decisão, no plano micro – sobre reconfigurações tecnológicas, modos de gestão e organização – e no plano macro – sobre as instituições que enquadram a adoção de novas tecnologias, as relações laborais, bem como as que regulam a proteção social;
Qualificar o emprego mediante a formação de quadros e a criação de emprego científico, diretamente, nas atividades do CoLABOR e indiretamente nas organizações em que o CoLABOR seja chamado a intervir.


No dia 6 de Novembro passado “
o CoLABOR apresentou a DataLABOR, uma plataforma inovadora que agrega e permite cruzar dados estatísticos e jurídicos sobre o trabalho e emprego, a proteção social e a economia social e solidária em Portugal e que pretende ser uma contribuição para a formulação de políticas públicas baseadas no conhecimento e apoiar a tomada de decisão de entidades privadas e associativas.
A DataLABOR disponibiliza dados nacionais e internacionais sobre trabalho, emprego e proteção social. Nasce de um laboratório colaborativo, o CoLABOR, que junta ensino superior, três dos maiores empregadores nacionais e o setor social. Irá dar contributos para a formulação de políticas públicas, como a resposta à pandemia provocada pela COVID-19, e, ao mesmo tempo, proporcionar a empresas, organizações sindicais, empresariais e do terceiro setor, informação necessária à gestão, tomada de decisões e formulação de estratégias.

Esta plataforma pode ser consultada em https://datalabor.pt/

Uma das iniciativas do CoLABOR são as suas inforgarfias. Um exemplo (consultável em
Pilar Europeu dos Direitos Sociais - CoLABOR
), cuja fonte é o Eurostat, tendo os cálculos sido feitos a partir dos ganhos mensais médios em €uros:


Fonte
: sítio do Laboratório Colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social (CoLABOR)

sábado, 5 de junho de 2021

[0287] O passado no presente: a Quinta da Fidalga, na Arrentela

Para quem, vindo da Amora ou da Torre de Marinha, se desloca na direcção do Seixal, a Quinta da Fidalga passa quase desapercebida. Logo após a rotunda que assinala o término da Arrentela, a Quinta situa-se à direita, por detrás do muro branco que acompanha a estrada. Querendo estacionar, para uma agradável e instrutiva visita, é mais fácil fazê-lo no sentido do regresso, que se pode tomar ou na bomba de gasolina ou na próxima rotunda (a que tem uma instalação de homenagem aos bombeiros).


A Quinta teve origens no século XV, e nela ainda se pode ver o essencial que caracterizou as centenas de quintas que, até bem dentro de século XX, ladearam Lisboa a Norte e a Sul, estando estas na margem esquerda do Tejo. Quem nela hoje entra começa por ver a casa nobre e o jardim, inclui este um invulgar Lago de Maré. Depois, afastando-se gradualmente, vê os pomares, sendo alguns exclusivamente de citrinos, situados no interior de um sistema de rega reticulado. Ladeando os pomares encontram-se vários pontos de lazer (grutas, pequenos lagos, longos bancos). Só bem mais longe, após subir para um nível mais elevado, encontra o largo poço, com um alcatruz enferrujado, sendo perceptível como, a partir dele, a água seguia até ser armazenada num vasto tanque, deste seguindo para os pomares.
Não é tão certa a identificação do local onde se situariam a seara, a vinha, o olival, a horta e as árvores destinadas a proporcionar lenha, bem como os indispensáveis lagares, mas o espaço para tudo isto era abundante, estando agora parcialmente ocupado por estufas.


O arquiteto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles (1922-2020) explicou, numa entrevista a Eva Maria Blum, em 18 de Fevereiro de 2005, como eram estas quintas e como desapareceram.

Gonçalo Ribeiro Telles:

As “pessoas importantes e que tinham dinheiro, tinham uma casa de Verão. A casa de Verão […] era muito perto da cidade. Era na periferia da cidade. […]. Eram as quintas. Havia à volta das cidades […] um anel de quintas. O que era essa quinta? Era um micro-mundo. Porquê? Porque a quinta tinha a casa, mas era simultaneamente de habitação, de produção de frescos para a casa, de vegetais para a casa.
Tinha depois uma coisa que caracteriza todas as quintas em Portugal, que é o laranjal. Porquê? Porque a laranja que tínhamos era uma laranja que vinha desde o tempo romano, azeda. Só para remédios e para coisas assim. Quando chegou a [actual] laranja, com as descobertas, era doce. Foi um êxito. E quem queria mostrar o seu prestígio tinha que ter um laranjal. Portanto, tinha outra coisa, que era o laranjal. Para ter o laranjal teve que aumentar os tanques de rega. Porque o laranjal exige muita rega, mais do que a horta. Portanto, aumentaram todo o sistema hidráulico. Se for ver, são tanques enormes nas quintas - quanto maior é a quinta maior é o tanque - com sistemas de rega, tudo aquilo. Depois, é tudo decorado.
A quinta tem o sistema hidráulico todo e tem outra coisa fundamental, que é a mata.
[O] termo «floresta» não é português. […]. Veio de fora, só no século XVIII. O nome de mata em Portugal, […] não é do povoamento para cortar madeira, é a mata propriamente, com aspectos ecológicos, com aspectos […] de gestão ajardinada […]. Portanto, tinha a mata. […].
[…]. A quinta tinha um dono e tinha os elementos de mata, porque tinha que ter lenha para se aquecer no Inverno. Tinha que ter mata para poder ter água, por causa da chuva e da mata. Tinha que ter horta porque não havia supermercados nem centros comerciais e tinha que ter o laranjal para cheirar bem e porque era o fruto por excelência.
[…]. Conforme o tamanho e a riqueza do senhor, tinha três, quatro empregados. Agora, a agricultura estava fora da quinta. Na quinta estava a agricultura de produção directamente para a casa. […]. A quinta era [murada].
[À volta de] Lisboa contámos […] seiscentas quintas.
[…]. Agora, como é que isto foi tudo destruído?
[…] Quando vieram os planos [de urbanização] de pormenor atribuíram a classificação da quinta exclusivamente à casa da quinta. Quer dizer, [a quinta está classificada] como um valor cultural e nacional. Você agora vai fazer o plano. […]. «Toda a gente olha para a casa, para o palácio. Então, porque é que não [se] há-de construir aqui, no sítio da mata, se nós deixarmos ficar o palácio? Porque é que não [se] há-de construir no sítio da horta se nós deixarmos ficar o jardim, que é uma coisa mínima» Nas nossas quintas, como sabe, o jardim está disperso, está diluído por todo esse sistema. Pelo tanque da rega, que é um sítio fresco; pela mata onde se passeia; pela horta, que tem as latadas para os percursos. O jardim é uma coisa mínima. A planta do jardim é muito ligada à casa. Por isso é que temos aquele sistema do jardim que é o alegrete. Aquele sistema daqueles murozinhos e plantados […]. Mas [também] tem mata, tem horta, tem laranjal, tem os alegretes e tem as latadas e tem os tanques. Ora, o que é que fizeram? «Ora, isto não é nada. Isto pode-se construir. Só não se pode construir no palácio e no jardim». E destruíram tudo. Aqui em Lisboa foi uma razia. Ficou a do Marquês de Fronteira [… e mais …] duas ou três.


Na margem Sul do Tejo ficou este quinta, no essencial intacta, e visitável, permitindo que seja usufruída e compreendida. Foi com base nesta quinta que Eugénio Silva desenhou, a pedido da Câmara Municipal do Seixal, uma «História do Concelho Seixal», onde se esquematiza como se interligariam os …



Há poucos anos, no extremo do jardim, foi construído, com projecto do arquitecto Álvaro Siza Vieira, a Oficina de Artes Manuel Cargaleiro.
Se esta Oficina é uma das razões para a visita de escolas ( e de adultos), toda a Quinta também o é.

Uma descrição da história e da actualidade desta quinta está acessível a partir da página Documentos (pasta «Documentos da Nossa Banda»).

Entrevista (não publicada) de Gonçalo Ribeiro Telles a Eva Maria Blum, em 2005
Desenho: BD de Eugénio Silva (2004)
Fotografias (tendo uma ou outra sido recortada): Eva Maria Blum, em 2021