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sábado, 24 de setembro de 2016

[0006] Experiência de ensino bilingue realizada na EB1 de Vale da Amoreira em 2008-12

Notícia publicada no «Sapo / Notícias» (http://noticias.sapo.cv/vida/noticias/artigo/1205414.html), em 5 de Dezembro de 2011, e acedida em 24 de Setembro de 2016: alunos portugueses aprendem em crioulo

Na escola EB1 de Vale da Amoreira, situada entre a Moita e o Barreiro, todos os dias, nos últimos quatro anos, acontece um micro fenómeno linguístico. O sucesso da experiência começa a ser cada vez mais do conhecimento público. Cerca de 19 alunos de uma turma do 1º ciclo, orientada por Ana Josefa e Ana Carina, professoras de Crioulo e Português, respectivamente, aprendem as matérias nas duas línguas, durante uma hora e meia, por dia. E os alunos são de origens diversas: portugueses, filhos de cabo-verdianos, angolanos, guineenses, etc. Os pais, esses, estão orgulhosos.

O pioneirismo da experiência vem atraindo a imprensa e a escola já recebeu até a visita da ministra das Comunidades de Cabo Verde. O projecto da aula bilingue vem sendo implementado pelo Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), desde o ano lectivo 2008/2009, com o financiamento da Fundação Calouste Gulbenkian.
Houve um tempo em que os próprios pais de alunos de origem cabo-verdiana desaconselhavam os seus filhos de falarem o crioulo, como aconteceu com o autor destas linhas: «O crioulo estraga a língua portuguesa», dizia-se, na altura. Mas a porta da sala de aula desta turma abre para um admirável mundo novo, um longo passo em direcção ao futuro, ao conhecimento, à mundividência.
Navegar numa língua diferente, aos nove anos de idade, é conhecer estórias de «Nho Rei», escutá-las com atenção, interpretá-las e explicá-las numa língua-irmã que se vai dominando, numa idade limpa de complexos e preconceitos. Com o crioulo chegam as cantigas, viaja-se, em uníssono, no «Barco di Papel», uma turma inteira transpondo fronteiras, compondo fantasias.
«Na nôs barco di papel, nu ta bai sonhá um futuro, na nôs barco di papel, nu ta bai té tchiga Lua»




A voz intensa e apaixonada da professora Ana Josefa é que orienta os acontecimentos dentro da sala. Mas a estória saída de «Na boca Noti», livro de contos do cabo-verdiano Tomé Varela da Silva, é que impõe o silêncio. Os alunos escutam atentamente o crioulo fluído da professora, os contornos da estória, no final todos levantam o dedo às perguntas.
«Esta turma bilingue é acompanhada por outra monolingue, uma turma de controle, em que aprendem só em português, para depois se compararem os resultados. E os resultados da turma bilingue são claramente superiores», explica Ana Josefa.




Nas cinco horas semanais, o crioulo de Cabo Verde é a língua de ensino de todas as matérias, os alunos não aprendem apenas a língua. «Aprendem matemática, estudo do meio, tudo o que for preciso.»
Quatro anos depois, os resultados estão à vista. Alunos de origens diversas, filhos de pais portugueses, angolanos, guineenses, dominam o crioulo, falado e escrito, assumindo a vanguarda numa experiência inédita e com excelentes resultados.
«De início, houve pais que não estavam muito de acordo com a ideia dos seus filhos aprenderem o crioulo. Passado algum tempo, quando escutaram os filhos a falar ficaram orgulhosos. Alguns até iam tocar na porta de algum vizinho de Cabo Verde, quando os filhos estavam com dificuldades em fazer os trabalhos de casa.»

Qual a variante a ensinar?

Quanto ao crioulo em si, as duas variantes faladas nas ilhas foram levados em conta pela professora Josefa. «Logo de início tivemos o cuidado de explicar que em cada ilha fala-se com algumas diferenças, assim como em Portugal os sotaques variam de região para região.»


E no que respeita ao alfabeto ensinado, Ana Josefa não tem dúvidas: «Nós já temos um alfabeto, que é o ALUPEC, que já foi aprovado, e é com base nele que ensinamos a escrita em crioulo, para além de quase todos os materiais de ensino, como livros em crioulo, estão escritos na variante de Santiago.»




Viagem às ilhas

O próximo passo desta viagem linguística e cultural, diz-nos Ana Josefa, é uma viagem com os alunos a Cabo Verde, programada para o próximo ano. «Os contactos já estão a ser feitos nesse sentido e estamos a recolher fundos.» Os próprios alunos empenham-se também em angariá-los, nem que seja através de rifas e a venda de uma caneta ao próprio jornalista, por uns meros 2 euros e meio.

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