Recentemente, o geólogo António Galopim de Carvalho pronunciou-se assim sobre os nossos professores e educadores:
“Devo começar por afirmar que
não estou aqui para agradar ou desagradar a quem quer que seja. Estou apenas a
revelar a análise que faço de um problema nacional que sempre me preocupou. Em
tempo de férias e a meio de uma pandemia e de uma pré-campanha eleitoral sem
qualidade no conteúdo e na forma, desejo saudar os professores (sem esquecer os
educadores) das nossas escolas e reafirmar que os considero entre os mais
importantes pilares da sociedade e, uma vez mais, dizer a governantes e
governados que é necessário e urgente restituir-lhes a atenção, o respeito e a
dignidade que a liberdade e a democracia lhes retiraram.
É verdade que dispomos de um parque escolar como nunca houve, é verdade que
temos escolas em número suficiente para acolher a totalidade da população em
idade escolar, é verdade que foi institucionalizado o ensino obrigatório e
gratuito até ao 12.º ano e é verdade que se democratizou o ensino, mas só na
letra da lei. Basta comparar as posições relativas das escolas públicas e
privadas nos agora intitulados «rankings» (uma maneira desnecessária de dizer
classificações).
Ao longo destes anos, verifiquei
que:
·
A preparação
científica e pedagógica dos professores não tem sido devidamente testada,
através de processos de avaliação a sério, criteriosamente regulados, por
avaliadores devidamente credenciados;
·
Como no antigamente,
a par de bons, muito bons e excelentes professores, muitos deles desmotivados,
há outros, francamente maus, instalados na confortável situação de emprego
garantido até à reforma;
·
Os sindicatos,
nivelando, por igual e por baixo, os bons e os maus professores, têm grande
responsabilidade numa parte importante da degradação do nosso ensino público;
·
Os livros e outros
manuais de ensino repetem-se acriticamente, com discursos estereotipados, em
obediência a programas mal pensados, levando ou, melhor, obrigando os
professores, não a ensinar e formar homens e mulheres conscientes do mundo e da
sociedade onde vivem, mas a «amestrar» alunos a acertar nos questionários de
exames, por vezes, autênticas charadas;
·
As sucessivas
tutelas parecem estar mais interessadas nas estatísticas do que na qualidade do
ensino;
·
Os programas
oficiais amarram os professores, não lhes dando tempo para, como alguém disse,
«divagações desnecessárias»;
·
Os professores estão
sobrecarregados com tarefas administrativas e outras de que deveriam estar
rigorosamente libertos;
·
Os professores estão
mal pagos e muitos deles vivem longe das famílias ou perdem horas nos caminhos
diários de ida e volta a casa e a contarem os tostões.
Em finais de 2015, na cerimónia
de entrega do Prémio Manuel António da Mota, no Palácio da Bolsa, no Porto, o
primeiro-ministro, disse: «De uma vez por todas, o país tem de compreender que
o maior défice que temos não é o das finanças. O maior défice que temos é o
défice que acumulámos de ignorância, de desconhecimento, de ausência de
educação, de ausência de formação e de ausência de preparação.» Palavras
sábias, mas que não passaram disso. A verdade é que continuamos na mesma, cada
vez com mais futebol e, agora, entretidos a tempo inteiro, dos pais aos filhos
crianças, a dedilharem nos telemóveis.
Quem não vir esta realidade ou é «cego» ou «tapa os olhos».
É, pois, urgente olhar para esta realidade e haver vontade política (despida de
constrangimentos partidários) para promover uma profunda avaliação e consequente
reformulação de uma «máquina ministerial» poderosa e nebulosa, de há muito,
instalada.”
Fonte: opinião de António Galopim de Carvalho no jornal «Público» (2021)
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