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terça-feira, 31 de dezembro de 2019

[0220] O problema da década


A transição entre 2019 e 2020 é uma mudança de década, ou esta só ocorrerá quando transitarmos de 2020 para 2021?
As opiniões dividem-se, tal como já se dividiram em 1999, altura em que à transição de década se juntaram as transições de século e de milénio

Há duas tradições que instigam esta divergência, tendo cada uma delas bons argumentos.

A tradição matemática, que posiciona os números num eixo e que, a começar no ZERO, faz crescer os positivos numa direcção, e os negativos na outra.
Para ela, o primeiro ano após o nascimento de Cristo seria o «Ano Zero», pelo que cada década terminaria nos anos em que se passasse da unidade 9 para a unidade 0. Então, agora, 31 de Dezembro de 2019, estaríamos na transição da 2ª para a 3ª década do século XXI.

A tradição cultural não organizou tão rigorosamente o calendário, pensou de modo mais prático: o primeiro ano após o nascimento de Cristo seria o «Ano Um», aliás como se estaria no «Século UM» e no «Milénio Um». Então, em 31 de Dezembro de 2019 ainda estaremos a terminar o 9º ano da 2ª década deste século, pelo que precisaremos de aguardar mais um ano para a transição apregoada.

A tradição cultural tem ligações à tradição de contagem na História: houve outros sistemas de contagem do tempo, como o número de anos de uma cidade, ou o número de anos de reinado de um rei. Mas também tem ligações a outros fenómenos de mais curta duração: Janeiro não é o «Mês Zero», mas sim o «Primeiro Mês». No entanto, é a intuição matemática que está presente noutras manifestações do nosso dia-a-dia: quando dizemos a nossa idade referimos quase sempre os anos completos que já temos – de um bebé diz-se, por exemplo, que «ainda só tem 10 meses».

Levar demasiado à letra a tradição matemática tem um grande contra: o 0 só terá sido introduzido na Europa por volta do século XIII depois de Cristo.
E levar demasiado à letra a tradição cultural também tem um grande contra: é que os historiadores concordam em que Cristo não terá nascido quando se diz que nasceu, mas sim uns anos antes.

Portanto, que as décadas não nos separem: se acharmos que vivemos em década diferentes, aproveitemo-nos disso para entender um pouco melhor este nosso mundo!

    

1 de Janeiro
Ano Novo
11 de Junho
Corpo de Deus
25 de Fevereiro
Entrudo
15 de Agosto
Assunção de Nossa Senhora
10 de Abril
Sexta-feira Santa
5 de Outubro
Implantação da República
12 de Abril
Páscoa
1 de Novembro
Dia de Todos-os-Santos
25 de Abril
Dia da Liberdade
1 de Dezembro
Restauração da Independência
1 de Maio
Dia do Trabalhador
8 de Dezembro
Imaculada Conceição
10 de Junho
Dia de Portugal
25 de Dezembro
Natal

terça-feira, 24 de dezembro de 2019

[0219] Em 1957, em 1982, em 2019: a vontade de um Novo que seja Bom


José Mário Branco (1942-2019) musicou e cantou, no duplo álbum Ser Solidário, de 1982 …


… o seguinte poema que Natália Correia (1923-1993) publicou em Dimensão Encontrada (1957):


QUEIXA DAS ALMAS JOVENS CENSURADAS

Dão-nos um lírio e um canivete
e uma alma para ir à escola
mais um letreiro que promete
raízes, hastes e corola.

Dão-nos um mapa imaginário
que tem a forma de uma cidade
mais um relógio e um calendário
onde não vem a nossa idade.

Dão-nos a honra de manequim
para dar corda à nossa ausência.
Dão-nos um prémio de ser assim
sem pecado e sem inocência.

Dão-nos um barco e um chapéu
para tirarmos o retrato.
Dão-nos bilhetes para o céu
levado à cena num teatro.

Penteiam-nos os crânios ermos
com as cabeleiras das avós
para jamais nos parecermos
connosco quando estamos sós.

Dão-nos um bolo que é a história
da nossa história sem enredo
e não nos soa na memória
outra palavra que o medo.

Temos fantasmas tão educados
que adormecemos no seu ombro
somos vazios despovoados
de personagens de assombro.

Dão-nos a capa do evangelho
e um pacote de tabaco.
Dão-nos um pente e um espelho
pra pentearmos um macaco.

Dão-nos um cravo preso à cabeça
e uma cabeça presa à cintura
para que o corpo não pareça
a forma da alma que o procura.

Dão-nos um esquife feito de ferro
com embutidos de diamante
para organizar já o enterro
do nosso corpo mais adiante.

Dão-nos um nome e um jornal,
um avião e um violino.
Mas não nos dão o animal
que espeta os cornos no destino.

Dão-nos marujos de papelão
com carimbo no passaporte.
Por isso a nossa dimensão
não é a vida. Nem é a morte.

Fonte da poesia: blogue Folha de Poesia
Imagem: CD «Ser Solidário» (1996)

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

[0218] Algumas pistas trazidas pelos resultados da 7ª edição do PISA


Foi divulgado há dias o relatório com os resultados da última edição do PISA, realizada em 2018:

Estes resultados podem ser acedidos e descarregados em www.oecd.org/pisa

A primeira edição do PISA (Programme for International Student Assessment) ocorreu em 2000, por iniciativa da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). Desde aí, a cada 3 anos, tem havido novas edições, com a intenção de avaliar como os alunos de 15 anos mobilizam os seus conhecimentos na resolução de situações do dia-a-dia.
Para tal foram escolhidas três áreas, Ciências, Matemática e Leitura, avaliadas em todas as edições, sendo uma delas particularmente privilegiada em cada edição. Desta vez tratou-se da Leitura, que já tinha estado em destaque nas edições de 2000 e 2009.

Um dos primeiros países cujos alunos obtiveram melhores resultados neste teste internacional foi a Finlândia, o que levou muitos especialistas e gestores da educação a pretenderem replicar algumas das suas escolhas para a organização escolar e curricular. O Sol finlandês foi, no entanto, de pouca dura: de seguida destacou-se a Coreia do Sul e, agora, para embaraço de quem faz análises baseadas nos rankings, destacou-se a China, Singapura, Macau e Hong Kong. Na Europa, desta vez, destacou-se … a Estónia.
Irão agora aqueles especialistas e gestores defender a replicação de outras formas de organizar as escolas e os currículos?

A China apenas participa nesta avaliação com alunos de escolas de quatro das suas províncias: Pequim, Xangai (que já decidira participar neste estudo, de forma autónoma, em 2009), Jiangsu e Zhejiang (que substituiu Guangdong em relação à edição de 2015). Além da capital, trata-se de três regiões costeiras, não tendo sido considerado o interior do país. Neste país, o Estado investe muito na educação, as escolas são obrigadas a prestar contas detalhadas e existe uma forte disciplina entre os alunos: antes de as aulas começarem já muitos estão na biblioteca a estudar.

Os resultados dos alunos finlandeses desceram em relação aos obtidos na década passada. Mas também aumentaram as desigualdades entre eles: maior número de alunos com melhores resultados; e maior número de alunos com piores resultados.

Este aumento das desigualdades também se verificou nos resultados da Leitura em Portugal: de 2015 para 2018, tanto subiu a percentagem dos melhores resultados (de 4,8 % para 7,3 %) como a dos piores resultados (de 17,6 % para 20,2 %).

Fontes: artigos jornalísticos de Silva (2019c) e de Viana (2019, on-line)